COMO NASCE
UM TIRANO
Os vídeos teriam sido gravados pelos próprios garimpeiros em território na região de Surucucu, onde há um dos maiores índices de garimpo ilegal do país
WINICYUS GONÇALVES
Repórter
FÁBIO GERALDO
Fotógrafo
Entre 2018 e 2021, para cada menina que teve acesso ao aborto legal, 31 deram à luz em Roraima. Levantamento inédito da Gênero e Número revela que, no período, 251 crianças de 10 a 13 anos deram à luz no estado, enquanto oito interromperam a gestação de acordo com a lei.
Com a maior taxa de fecundidade no país entre meninas de 10 a 14 anos, Roraima conta com uma única equipe autorizada a realizar o serviço de aborto legal, que atende no o Hospital e Maternidade Nossa Senhora de Nazareth, em Boa Vista. O procedimento é permitido em menores de 14 anos grávidas, uma vez que qualquer relação sexual com crianças nesta faixa etária é tipificada como estupro.
Ilda Mani Isaquir, ginecologista e obstetra do Nossa Senhora de Nazareth, afirma que nunca se negou a realizar um aborto legal, mas confirma que já orientou meninas e mulheres a não realizarem o procedimento, já que pessoalmente não concorda com a interrupção voluntária da gravidez.
"Uma violência brutal na região do Hakoma que aconteceu isso, e as crianças estão correndo risco nessa região. E os garimpeiros amarraram as crianças. Isso a gente recebeu. Por isso, nós estamos preocupados".
DÁRIO KOPENAWA
Líder yanomami
Os profissionais de saúde também não devem, segundo a especialista, dar ênfase indevida a supostos riscos que não sejam embasados em evidências científicas.
A assistente social Lívia de Oliveira Lima, da equipe do aborto legal da Maternidade Nossa Senhora de Nazareth, afirma que usa como referência a portaria nº 2.561, aplicada em 2020, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), que previa a necessidade da equipe médica notificar a autoridade policial em caso de aborto por estupro. No entanto, a portaria foi revogada em janeiro de 2023, no primeiro mês do governo Lula (PT).
Terezinha Muniz, titular da Defensoria Especializada de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher, ressalta que o conservadorismo da população local é um obstáculo para a luta contra as violências vividas pelas mulheres em Roraima.
Muniz afirma que há casos em que a equipe médica faz exigências não previstas em lei para realizar o aborto legal, como o registro de Boletim de Ocorrência ou a compatibilidade da idade gestacional com a data da violência sexual.
O defensor público Januário Lacerda foi acionado em agosto de 2022 para intervir no caso de uma mulher venezuelana que, mesmo após registrar Boletim de Ocorrência por estupro, teve o serviço do aborto legal negado pela Maternidade Nossa Senhora de Nazareth.
Segundo Lacerda, a equipe médica não quis realizar o procedimento porque a idade gestacional não batia com a data em que o estupro teria ocorrido no Brasil. Só que, segundo o defensor público, a mulher havia sofrido violência sexual no percurso de migração. A jovem, de 18 anos, foi estuprada em um garimpo no seu país de origem e forçada a trocar serviço sexual por comida por um homem que lhe ofereceu carona até o Brasil.
Após fazer a escuta da vítima, Lacerda identificou que a gestação ocorreu a partir das violências sofridas no trajeto. Ele procurou a Delegacia da Mulher e verificou a possibilidade de refazer o relato. Sensibilizada com a situação, a delegada refez o Boletim de Ocorrência e, só então, a vítima conseguiu acesso ao serviço do aborto legal na Maternidade Nossa Senhora de Nazareth.
Gabriela Rondon reforça que não é necessário registrar boletim de ocorrência para abortar legalmente no Brasil. O BO se faz necessário apenas se a mulher tiver o desejo de responsabilizar o agressor pelo crime.
“[No caso da imigrante venezuelana], ela poderia ter retornado ao hospital e solicitado um novo atendimento, explicando a história, inclusive dizendo que se confundiu ou que não contou a história inteira. Isso deveria ser levado em consideração pela equipe”, avalia a advogada.
Segundo Lacerda, a equipe médica não quis realizar o procedimento porque a idade gestacional não batia com a data em que o estupro teria ocorrido no Brasil. Só que, segundo o defensor público, a mulher havia sofrido violência sexual no percurso de migração. A jovem, de 18 anos, foi estuprada em um garimpo no seu país de origem e forçada a trocar serviço sexual por comida por um homem que lhe ofereceu carona até o Brasil.
Após fazer a escuta da vítima, Lacerda identificou que a gestação ocorreu a partir das violências sofridas no trajeto. Ele procurou a Delegacia da Mulher e verificou a possibilidade de refazer o relato. Sensibilizada com a situação, a delegada refez o Boletim de Ocorrência e, só então, a vítima conseguiu acesso ao serviço do aborto legal na Maternidade Nossa Senhora de Nazareth.
Gabriela Rondon reforça que não é necessário registrar boletim de ocorrência para abortar legalmente no Brasil. O BO se faz necessário apenas se a mulher tiver o desejo de responsabilizar o agressor pelo crime.
“[No caso da imigrante venezuelana], ela poderia ter retornado ao hospital e solicitado um novo atendimento, explicando a história, inclusive dizendo que se confundiu ou que não contou a história inteira. Isso deveria ser levado em consideração pela equipe”, avalia a advogada.
UMA VIOLÊNCIA BRUAL NA REGIÃO DO HAKOMA QUE ACONECEU ISSO, E AS CRIANÇAS ESÃO CORRENDO RISCO NESSA REGIÃO
COMO FIZEMOS
ESTA REPORTAGEM?
1
Baixamos os microdados do Saresp 2022 no site do governo de São Paulo, e utilizamos linguagem SQL (banco de dados) para filtrar apenas Ribeirão Preto.
2
Com isso, conseguimos o desempenho anonimizado de cada um dos 22.680 estudantes riberão-pretanos que prestaram a prova no ano passado.
3
Filtramos apenas os alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, e analisamos a proficiência e nível de proficiência de cada um deles nas disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática e Ciências
4
Nas análises por rede ou escola, DESCARTAMOS os alunos que não tinham a nota publicada na disciplina analisada.
QUANTO VALE SABER SOBRE ISSO?
Investigar uma reportagem como essa dá muito trabalho e custa caro. passa meses mergulhada em uma mesma história para documentar crimes ou abusos de poder e te informar sobre eles.
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